Este texto e o título são inspirados em um livro muito interessante de Gisela Pankow, sobre a construção e formação da psique com relação ao ambiente de vivência do homem.
Esta não é uma resenha do livro, mas um texto meu sobre o mesmo tema, do meu ponto de vista, simplificado ao máximo para a dimensão da internet.
Em se tratando de construção da psique, assumo que este texto tem vertente psicanalítica, simbólica e até mesmo topológica. A formação do ser humano, sua mente, é também produto do ambiente onde ele vive ou viveu, suas histórias, lembranças atmosféricas, texturas, dimensões. A escala do humano com relação ao espaço vivido, as cores, tudo conta.
Não se trata da aplicação direta da tese da tabula rasa de Locke, se bem que não se pode ser ignorado que a mente é construída após a concepção orgânica. Porém, a idéia central é compreender o custo que há naquilo que não é mensurável: a saber, a simbologia e moldagem que o ambiente –leia-se arquitetura e urbanidade, paisagismos e decorações, luminotécnicos e todos os termos do ambiente real – proporciona à mente. Este é de longe o mais intangível e menos mensurável dos custos /benefícios que um projeto arquitetônico pode proporcionar.
A relação entre os ambientes, as dimensões, a perspectiva de mudança para melhor, a valorização e diversos itens que são próprios da arquitetura, imprimem-se no quotidiano, sobre a percepção humana, e dali, para sua própria constituição.
As simbologias são simples de serem compreendidas. Supomos uma residência onde há na entrada, logo que a adentramos, uma escultura de uma criança de ponta cabeça. É óbvio que se a escultura fosse de um leão, um anjo ou uma obra abstrata as interferências seriam outras. E ao longo de um período de tempo, isso passa a fazer parte da própria tessitura da linha de raciocínio do usuário, seus caminhos mentais, seus ícones, obstáculos e atalhos: símbolos que ganham vida e força em sua mente. Assim, uma grande parede vermelha é diferente de uma grande parede azul, não só pela cor, mas pela conseqüência na vida real que ela produz. A possibilidade de ampliação de uma residência, é impressa na própria forma de viver do usuário, que assimila essa propriedade. Por outro lado, uma casa estrangulada, sem perspectiva de mudança ou crescimento, de valorização ou de vida útil, engaja uma mentalidade estacionária e enclausurada e até mesmo, bloqueada para princípios emocionais do dia-a-dia, chegando inclusive a interferir nos relacionamentos humanos, econômicos, políticos, etc.
Até mesmo a linguagem que é adotada num projeto ou urbanidade interferem na mente humana: uma loja toda rebuscada e cheia de objetos arquitetônicos pretensiosos é diferente de uma loja simples, clean. O usuário exala essas manifestações após certo tempo. Passa a incorporar aquele teor, aquela emotividade. Isso chega até o visitante, o consumidor, o apreciador que passa.
A isto, chamamos de parte do “partido arquitetônico” que se refere ao universo de decisões que comporão uma obra ou ambiente. E palavra abrangente, partido, referindo-se a posição ética, moral, política, econômica, religiosa, estética, lógica e técnica. E todas as outras que possam compor as decisões arquitetônicas.
A estes aspectos não mensuráveis, que podem e devem extrapolar o domínio do simples custo/rendimento em termos numéricos, devemos dar a maior ênfase e atenção, uma vez que o humano não vive em números: mas em percepções, simbologias, linguagens, dinâmicas, fluxos e hierarquias em diversos níveis, não só materiais.
Este custo arquitetônico é o que difere um bom projeto de um projeto ruim – dificilmente percebido por quem não é da área, mas sempre deixa um “quê” de desconfiança sobre algum aspecto desagradável de um projeto, mesmo que não se saiba o porque. Não é necessário ser especialista para sentir um projeto maravilhoso ou um péssimo, e distingui-los. Mas é necessário ser especialista para se conceber isso, a La carte, para um cliente, seja lá qual for o nível econômico do projeto, suas dimensões e perspectivas de uso.